Reparo as pessoas andando pelas calçadas desbotadas,
atravessando o cinza das ruas. Esse desfile cotidiano de passos apressados
sempre vem acompanhado pelo gesto inconsciente de balançar os braços num
movimento cômico, sem compasso. E de que adianta tanta pose, tanto toque-toque
de salto alto, se todas essas pessoas, como que numa coreografia ensaiada,
apresentam a mesma dança de braços ridícula, que as torna todas iguais? Elisa
aperta as mãos na cintura, na tentativa de evitar esse balanço. Funciona nos
cinco primeiros segundos, depois a reluta vira incômodo. Tudo inútil, a tentativa
de fazer diferente dissipa quando os braços caem livres rumo a dança das mãos. Como
o cobrador de ônibus de uma cidade pequena, que quando pensa em querer que tudo
seja diferente (só por hoje) sente as sobrancelhas murcharem, puxadas para baixo
pelo desânimo ao ver os mesmos rostos matinais enquanto o resto do mundo ainda dorme.
As mesmas pessoas sobem os três degraus e entregam o dinheiro da passagem sem mirar
o homem no outro lado da catraca. Foi a mesma cena ontem, na semana que passou e
vai ser assim amanhã. Eis a vida mostrando sem fazer esforço que tudo vai permanecer
igual. É tanta ausência de sorrisos, meu Deus! Um gesto singelo desarma qualquer
vestígio de uma noite mal dormida. Pena que serenidade não seja comum e involuntário
como o balançar dos braços.