quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

↕ Escolhas e Mudanças

O metrô passa, ou seja lá o que for o meio pelo qual você deve embarcar pra seguir o seu caminho. Ele passa, você sobe ou fica ali, à deriva. Escolhas, malditas são as escolhas. O que você deve escolher para chegar a tal lugar. O que você deve usar para se chegar aonde tem que chegar. Não é preciso ter nenhuma bola de cristal de merda para saber certas coisas do futuro. Como dois mais dois sempre será quatro, ou como a morte é inevitável. Ou ainda como certas escolhas estão diretamente relacionadas com mudanças necessárias na vida de qualquer pessoa. Afinal, somos sim "metamorfoses ambulantes”. Caso fosse o contrário, o tempo seria inútil, e a vida seria apenas um amontoado de bactérias, alojadas num ser estirado no sofá, em frente a uma tevê. Mudanças fazem parte do sistema vital do ser humano. Até as borboletas tem suas crisálidas abertas, para que, o que antes era lagarta, possa se libertar do casulo. A crisálida seria uma espécie de metrô. O tempo dentro do casulo, é como o tempo passado a bordo do meio que o leva a tal escolha, que o leva a mudança inevitável. É necessário embarcar, mas é essencial largá-lo na hora exata, ou as oportunidades vão embora, sem dar adeus. Como uma borboleta que voa pra longe, até que seus olhos a perdem de vista, para sempre.

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

↕ E Então Foi Natal...

Eu passo na rua, e dou de cara com uma menina, talvez mais nova do que eu na época dessa foto, sentada no chão pedindo esmola. Uma menininha linda, diga-se de passagem. Muito breve foram os segundos que a mirei, mas foi o tempo sufiente para ela, com toda sua inocência, olhar para mim, com seus expressivos olhos negros de amendoas, e soltar um doce e singelo: oi! Talvez haja algo em mim que transmita confiança necessaria para tal acontecimento. Um simples oi. Quem sabe, ela acredita em Papai Noel. É natural, pais acreditam que está no "seu papel" iludir os filhos com fantasias idiotas. E então ela não perde a esperança, e acredita. Afinal, acreditar não custa nada, não é? E então ela acredita no tal velhinho, o mesmo que não lhe trará presentes, o mesmo que a deixa ali, no chão. Um simples oi, que não me sai da cabeça. Enquanto eu continuar vendo coisas assim - o que ainda irá acontecer diversas e diversas vezes - desculpem, mas não conseguirei dizer "Feliz Natal", sem sentir um forte e incontrolável asco que me embrulhe o estômago. Talvez a Jozieli de 13 anos atrás fosse capaz de tal proeza. Eu, não.

terça-feira, 25 de dezembro de 2007

↕ O Adeus

O vento morno de uma tarde de primavera, sem cerimônia alguma, insiste em lhe bagunçar o cabelo, – convenhamos, o cabelo dela já é bagunçado. Algumas pessoas passam indiferentes. Outras, porém, arriscam olhá-la. Ela, com sua mania equivocada de achar que pode ler pensamentos alheios, decifra: “Ela deveria jogar fora aquele livro e ler uma revista Capricho, pra ver se descobre um milagre do tipo: "Descubra-Como-Domar-a-Sua-Juba-de-Leão”. Ela não se importa, e continua no seu Jogo-de-Perguntas-e-Respostas. Se bem que quase nunca encontra as tais respostas. Ela se pergunta quais são as chances de uma outra pessoa, em qualquer outro lugar, sentir a mesma rajada de vento que lhe arma as madeixas. Uma entre quantas centenas? Milhões? Nenhuma! Tudo isso é um jogo de hipóteses sem sentido. Aonde já se viu perder tempo pensando em tamanha sandice. Perder tempo pensando em algo que nem se pode ver. De fato ela não tem o que fazer. O mesmo vento que a toca, guia a coluna de pássaros, que enfeitam o céu cor-de-rosa do entardecer. Não consegue identificar a cor de cada um – óbvio. Suspende a leitura, e fica ali, olhando para o céu. “Um leão, sentado no banco da praça, com um livro na mão, olhando para o céu”. De repente, sentiu-se imensamente triste. Como se o que estivesse vendo, fosse um adeus. Pássaros que voam sobre a sua cabeça, em marcha seguindo para algum lugar. Um adeus. Naquele instante, ela desejou com todas as forças sair dali voando, entrar no final da fila e ir sem rumo pra qualquer lugar. Apenar ir, pra outro lugar. Quem sabe o vento a encontre, quando ela tiver partido. “Um leão voador”. As pessoas, embora diferentes, tão iguais. Continuam passando, seguindo o rumo de suas vidas medíocres. E ela se pergunta se há alguém nesse instante vendo os mesmos pássaros, sentindo o mesmo adeus que lhe aperta o peito. A resposta não veio. Um calafrio. Sensação estranha. Ela continua olhando. Até que o último pássaro foge do seu alcance. E ela volta-se para o livro. O seu último livro.

↕ Deixar de Amar

“Até que a morte nos separe, meu amor.” Literalmente, quanta sandice! Não generalizando, mas na maioria dos amores intitulados eternos, o amor acaba antes mesmo que um dos lados reumáticos estique as canelas. É, a vida é realmente cruel. O cruel na verdade é deixar que a vida, ou a morte, separe um amor. Eu conheço pessoas que continuam amando seus parceiros, mesmo depois da visita da senhora Morte. Estranho? Não, eu diria raro. E é assim que as coisas deveriam ser. Não me refiro a empalhar o defunto e deixá-lo na sala sentado na poltrona com a tevê ligada, como se o coitado fosse um zumbi. Me refiro ao fato das pessoas acharem justificativa para tudo, nesse caso colocar o peso todo nas costas da morte. A morte é inevitável, e é uma das poucas certezas que temos sobre o futuro. A morte não é cruel, ela é necessária. Uma ponte de transição. É fácil dizer isso quando ainda não morreu – HAHAHA, faz-me rir com tamanha idiotice, Jozieli! Ou mais fácil quando nenhum de seus amores platônicos ou romances efetivos, partiu dessa para melhor. Já tive perdas, já chorei e já quis morrer, melhor, explodir o mundo – que o Pentágono não tenha conhecimento destas últimas palavras. Nunca perdi um amor, apenas nunca tive um. Melhor não ter do que perder. É incrível a facilidade das pessoas em se intitular apaixonadas, completamente entregues ao amor verdadeiro. Santa hipocrisia. Mas voltemos à morte que separa os tais “Amores-Eternos”. Ela não deveria separar amores. Também não sou tola nem hipócrita a ponto se dizer que é possível manter contado com alguém depois de morto via uma conexão celestial, ou infernal. A morte separa, embora não devesse. O hilário é que as pessoas a usam como justificativa. Antes mesmo dela chegar, já estão a chamando. Somente os corajosos continuam amando mesmo com a chegada da morte. Somente os insanos e dementes amam, sem se preocupar com a morte, pois apenas amam enquanto estão vivos. Corajosos, insanos e dementes. Pois quem ama tem que ser corajoso o bastante, insano ao extremo e muito, muito demente! O amor é isso: raro e insano. “Como pode alguém ser tão demente, porra-louca, inconseqüente e ainda amar?” – sábio Cazuza. Eu mesma diria de outra forma: Como pode alguém ser tão demente, porra-louca, inconseqüente e deixar de amar?

↕Último Despertar

Seu sono foi interrompido pelo choro que ao longe perturbava e invadia seus sonhos. Era um choro abafado, intrigante e curioso. Sem nem perceber, já estava em meio ao corredor, com a face iluminada pela luz da lua que havia passado entre as finas gotas daquela chuva de outono, e que invadindo através da janela, quebrava a penumbra daquela triste noite, que reforçava ainda mais a escuridão e a melancolia que tomavam conta do velho casarão.Não havia nada que pudesse lhe tirar a estranha ligação que a guiava em direção a aqueles gemidos. Sem saber ao certo porque, reconhecia aquele pranto, e sentia as mesmas lágrimas choradas até então por um desconhecido, lhe cortarem a face, como que um pressentimento de que estava prestes a descobrir algo que mudaria toda sua existência, e que tudo o que havia aprendido e visto até aquele instante, de nada mais valeria, porque, sem nenhuma resposta, sabia que não iria mais precisar do seu passado e o futuro seria incerto para sempre, a partir dali. Todos esses pressentimentos e esses estranhos sentimentos a assustavam e a deixavam ainda mais perturbada.Na medida em que se aproximava dos gemidos, a chuva que antes era calma e serena, agora, estava forte e abafava ainda mais aquele pranto. Mas mesmo assim, pôde perceber que havia varias pessoas e não apenas uma como no inicio, e que enquanto uma se destacava pelo angustiante pranto, as outras murmuravam baixinho, como uma platéia, que de camarote, não queria interromper o espetáculo.Já avistava a opaca luz que vinha da capela, e a alguns passos de descobrir o que tudo aquilo significava, o choro que antes era abafado e contido, agora estava prestes a ser interrompido por um grito de dor e melancolia. Foi no exato momento em que se pode ouvir um assustador e agudo grito de NÃO, que segundos depois, foi repetido por ela como um eco, que ao se deparar com aquela cena, não teve outra reação se não dizer NÃO. A sutil diferença é que ao contrario do primeiro grito, o seu não foi ouvido por mais ninguém, além de si própria.Ao chegar à porta da antiga capela, se deparou com sua mãe debruçada em cima de um caixão desesperada aos prantos, molhando com suas tênues lágrimas o mesmo vestido que ela havia ganho semanas antes, e que pretendia usar no natal.Foi correndo até o caixão. Esbarrou no irmão que do lugar não se mexeu, passou entre os conhecidos e os desconhecidos, mas ninguém a viu. Gritava por ajuda, pedia explicações: “Mamãe, mamãe, o que houve?”... “Eu estou aqui não chores”. Era inútil, ela não existia mais.Estava em pé, ao lado da mãe, olhando perturbada aquela cena. Ficou olhando para si mesma dentro do caixão por um longo tempo. Estava pálida, tinha nas mãos entrelaçadas em cima do ventre, uma flor branca. Os finos fios dourados do seu cabelo haviam perdido a cor. Seus olhos agora selados por toda a eternidade, jamais voltariam a ver o nascer do dia seguinte. Ela não lembrava de nada, não sabia como, nem porque havia morrido, era apenas uma menina de 16 anos, que ao acordar no meio de uma noite qualquer, percebeu que nunca mais haveria pôr-do-sol.Ela se tornou uma alma esquecida, e tudo o que havia aprendido sobre inferno e céu, não fazia sentido algum, pois ela continuou vagando pelos cômodos da casa, para sempre. Talvez o paraíso fosse lá, ou o purgatório.Os dias foram passando, no inicio ela pegava alguém em algum canto da casa lamentando a sua ausência, e aquele pranto daquela última noite se repetiu incontáveis vezes, mas com o tempo se tornou cada vez mais raro, e as lembranças da sua existência foram desaparecendo com os anos, da mesma forma que seu rosto perdia a nitidez e ganhava uma cor amarelada, no retrato preso na parede da sala. Às vezes parecia que ela nunca havia existido. As pessoas seguiram suas vidas sem ela, o que a frustrava de tal forma que um dia cansou de tentar fazer com que alguém a ouvisse ou a visse. Ela demorou, mas entendeu que era inútil, pois você não vê o que não lembra e você não ouve o que já esqueceu.Os anos seguiram a lei do tempo. Todos morreram, todos. E ela nunca entendeu porque somente ela estava condenada a passar toda a sua eternidade na velha casa, que hoje é habitada por outra família, e ela sabe que virão outras e outras, tão iguais e tão diferentes desta e das que já moraram em sua casa. Ela também sabe que todos a deixarão e somente ela restará, pois todos a sua volta a deixam sozinha.Quem sabe um dia ela não desperte de um sono profundo com um choro perturbador de sonhos, e talvez tudo não tenha passado de um longo e triste pesadelo, e ela poderá usar o vestido no natal como havia planejado, e quem sabe fazer tudo aquilo que sempre desejou. Mas ela nunca mais adiará os planos por muitos dias, já que estes podem nunca vir a chegar, pois quem sabe este poderá ser o seu “último despertar”.

↕ As Paredes

Quando as paredes estavam em pé, o lugar foi uma espécie de pavilhão onde aconteciam velórios. Há doze anos atrás, uma menina pálida de cabelo dourado e longo, levemente cacheado nas pontas descia de um carro e se deparava com as mesmas paredes, até então inteiras. As paredes eram fortes, gigantescas perante Ela. Ela temia, não queria entrar, mas foi inevitável. As paredes estavam em pé, Ela desmoronava. Chovia, ventava, o dia não poderia ser mais triste. Talvez se o céu estivesse azul, e pássaros dançassem nele, as coisas teriam sido menos difíceis. Mas seria uma hipocrisia. Ela não entendia direito o que estava acontecendo. Tinha viajado horas e horas e estava exausta. Seus olhos amendoados estavam sem o brilho. E em breve o cabelo perderia a cor, e a sua palidez se tornaria mais forte. Ela sabia que as coisas mudariam, que as coisas tinham mudado nas últimas horas. Sabia que lembraria daquele dia para sempre, e sabia também que teria que fingir que tinha o esquecido, se quisesse ser forte. Ela tinha que ser forte. Buscar força em um lugar até então, desconhecido. Nesse dia ela aprendeu que as coisas se perdem. Nesse dia ela aprendeu que as perdas geram mudanças.. Doze anos mais tarde, ela volta no mesmo lugar. Se depara com as mesmas paredes, só que agora desmoronadas. Ela esta de pé. Venceu o tempo, aprendeu a se esconder quando quisesse chorar e lembrar daquele dia. Encontrou a força e a guardou, a cultivou. Ela mudou. As paredes mudaram. Ela esta em pé. As paredes desmoronaram.

↕ Ela Jurou

Num sonho, Ela lhe deu a flor, que era a última. Ela jurou nunca mais voltar lá. Enquanto Ela seguia o mesmo caminho, a brisa do vento batia em seu rosto. Vento morno, sensação de uma insustentável leveza. Cabeça baixa, olhos que miravam o chão. As folhas secas dançavam na rua entre os seus pés, como se estivessem felizes pelo seu retorno. Lembrava do caminho, da mesma forma que lembrava do sonho que não foi seu. Ela jurou que nunca mais lembraria. Ela jurou que nunca mais sonharia. Tudo em vão, pois por mais que repudie, o sonho dorme e acorda ao seu lado. Todas as noites, Ele sempre está lá. Há algum tempo, Ela jurou que nunca mais o deixaria passar a noite, ao seu lado. Mas quem pode decidir o que sonha? Na tentativa de manipular seus sonhos, tentou não sonhar com sonhos alheios, pois acreditava que se não sonhasse, não lembraria. Acordaria todas as manhãs e não olharia para o lado. Não o veria, o esqueceria. Ela jurou que nunca mais lembraria do sonho. Dias e dias, Ela conseguiu. Ela esqueceu o sonho. Porém, em uma manhã ao despertar em sobressalto, Ele acordou do seu lado. O sonho, o mesmo. A flor, a mesma. A rosa branca que Ela um dia, lhe deu. “Essa era a última flor”, foi o que Ela disse. A flor que era a última, vem seguida por um beijo. O último beijo. Ela jurou que nunca mais sonharia. Mas quem pode decidir o que sonha? E Ela sonha. E continua jurando, em vão.

↕ Olhos Expressivos e Insanos

Olhos negros, expressivos e insanos. Expressivos, pois transmitem esse ar de observador nato, que você é. Seus olhos, falam por si só. Diante deles, as palavras tornam-se dispensáveis. Insanos porque, convenhamos, insanidade é o que você vê o tempo todo. Insanidade é o que nós vemos, é o que nós vivemos. Olhos refletem como um espelho o que vemos, e o que vivemos. Pois bem, sendo assim faço jus à primeira frase: seus olhos são expressivos e insanos. Olhos que condenam e contemplam. Tantas foram as vezes que esses olhos me condenaram. Tantas foram as vezes que esses mesmos olhos, me contemplaram – essa última muito mais que a primeira! Há quem afirme que uma conversa “olho no olho” é capaz de transmitir confiança e sinceridade, pois os olhos mostram verdades. Eu concordo! Mas para dois pares de olhos se encararem, requer muita coragem – ou seria, insanidade? Afinal, se os olhos são a janela para a alma, como dizem, sabe-se lá quais surpresas se escondem nos olhos alheios. Corrijo, não, não é questão de coragem, e sim confiança. Para dois olhares se encontrarem e permanecerem unidos, requer confiança. Sendo assim, depois de muito recuar, encarei seu olhar. O deixei cruzar diante do meu, e ali ficar. No instante em que olhei no fundo dos seus olhos, encontrei algo inestimável, encontrei um grande amigo.

↕ O Tempo Que Eu Preciso



Crises existenciais me acompanham como cócegas nos pés, desde menina. E ontem, no meio de mais uma dessas intermináveis crises, lembrei de um fato curioso. Há algum tempo, a irmã de uma guria, que na época era minha amiga e que hoje em dia nem converso mais, a não ser semana passada quando a mesma passou por mim na rua e me soltou um belo sorriso frouxo e amarelado, e um “oi” quase que vomitado. É incrível como as pessoas passam pela nossa vida, e não deixam nenhum vestígio. É raro as que permanecem. Então, voltando à reflexão do inicio, a irmã da guria do sorriso amarelo, estava beirando os quinze anos. Ela me disse a seguinte frase: “Ih, daqui a pouco chego aos dezoito. O tempo voa, que você nem vê!” Eu, com oito anos na ocasião, sonhava em usar sutiã, tinha nojo de beijo na boca, queria ser professora e não via a hora do tão almejado quinze. Pensar nos quinze anos, provocava um certo brilho no olhar. Quanta tolice!! É, quinze anos é algo esperado para qualquer guria. Sei lá o porquê, mas só sei que é assim. Bem no fim, o tal quinze chegou e passou rápido! Parece que foi ontem que a tal frase “ o tempo voa” foi dita. Isso assusta, né? As coisas passam rápido, a vida passa rápido. Você acorda sem ter certeza se vai dormir. Às vezes algo insignificante, segundos, pode mudar o rumo da sua vida! Só quem já teve perdas, acho, pára pra pensar o quanto o tempo é curto. Sim, nunca me recuperei da tal perda paterna, talvez seja por isso que eu possuo uma leve perturbação – muito leve, quase imperceptível, diga-se de passagem! A intenção desse texto não era escrever nada biográfico, era na realidade para refletir. Refletir o quanto o tempo é de fato muito curto, passa rápido e não espera ninguém. Mas espero, sinceramente, que daqui uns 10 anos, eu esteja escrevendo outro texto, talvez com os mesmos medos, aflições e cócegas existenciais, mas com alguns dos meus mais singelos sonhos já em mãos: uma mesa entulhada de papeis, em uma redação de uma revista semanal de grande circulação; uma bela casa no mato, com uma lareira e árvores, muitas árvores; um laboratório fotográfico; já ter ido para a África fazer um documentário; já ter escrito algum livro; já ter ganho algum prêmio Esso; e por fim, conseguir retribuir tudo o que a dona Lucia já fez por mim nessa curta vida. E beirando os dezoito, eu espero apenas uma única coisa da vida: que me dê o devido tempo, que eu preciso!

↕ Ela é Minha Vida



Ouvir a seguinte frase: “você é minha vida", deve ser no mínimo bom. É, somente bom, sem nenhum exagero ou maços de cabelo arrancados devido a uma declaração dessas. Para muitos, parece tolice dizer que um outro alguém é "a sua vida". Como podemos jogar nos braços de outro, todo o peso destinado e referente somente a nós mesmos? Contesto, isso é pura inveja e egoísmo. Afinal, como é bom fechar e olhos, e no meio da escuridão ter alguém a quem se pode, sem medo de pestanejar, ceder sua própria vida! Nem todos têm essa sorte. É, eu chamo de sorte. Acredito que uma vida possa parar, ou acabar com a ausência de outra. É incrível como as pessoas são dependentes umas das outras. Hitler até já fez experiências sobre isso. Algumas pessoas tornam-se a essência de outras, como algo vital para a sua sobrevivência. Amor materno, eu diria, é assim. Talvez seja o único amor capaz de tal proeza. Por isso podem até me intitular: tola. Jozieli, a tolice em pessoa! Admito, resumi minha vida a um metro e meio, da fisionomia materna. Digo com todas as letras : “ela é a minha vida”. Convenhamos, ceder seu próprio ventre, e ainda ver estampado no intruso inquilino, traços expressivos e temperamentais, até então únicos e exclusivos seus, isso é vida! Desde criança, quando algo vai além da sua própria capacidade de entender ou resolver, solta-se o grito, e em um tom exagerado, fala-se: MÃÃÃÃÃE! Ah, não sejam hipócritas, todo mundo já passou por isso. Recorrer à mãe, ou seja lá quem for a tal figura materna, quando algo foge do controle. Isso é sinônimo de proteção, amparo e amor incondicional. A quem mais poderia eu, entregar minha valiosa vida? Somente a ela, Mãe.

↕ Alguém Como Você


E então você se vê com a capacidade de “prever o futuro”. Consegue dizer com precisão de tempo quando algo irá acontecer. Algo decisivo. A sensação de ter asas. A sensação de ser guiado por um anjo. Habilidades assim vêm e passam, como uma vertigem momentânea. Entranto, acontecem apenas com a pessoa certa! Olhar em olhos alheios e ver refletido, como se estivesse diante de num espelho, uma aura pura. Olhar nos olhos e ouvir verdades. É incrível como existem pessoas que conseguem mentir olhando nos olhos. É incrível como existem pessoas que conseguem, apenas olhando nos olhos, enxergar a alma do outro. É incrível como esse último tipo de pessoa é rara. É incrível como existem pessoas que não só dizem verdades como também enxergam a alma de alguém e a decifram. Decifrar uma alma requer não habilidade, mas é necessário haver algo de muito especial entre duas pessoas para que suas almas se façam nuas e se deixem decifrar por ambas. Com pessoas assim você consegue o, até então, desconhecido, o impossível. Com pessoas assim você consegue enxergar o futuro. Com pessoas assim você consegue voar. Com pessoas assim você consegue olhar nos olhos dizer e ouvir as mais sinceras verdades. Com pessoas assim você descobre o que significa a palavra raridade. E você descobre que é uma pessoa de sorte por ter encontrado alguém assim. Alguém como você, Mauricio.

↕ A Imortalidade

Acenda uma vela.
Ilumine o caminho.
Guie alguém.
Guie os cegos que enxergam.
Torne-se imortal.
Escreva!
Dê vida ao inanimado.
Devolva a vida de alguém que capenga.
Desate nós.
Quem escreve permanecerá vivo.
Em cada chama de vela.
Em cada palavra sua que foi capaz de iluminar o caminho de alguém.
Depois do Adeus, você pode continuar presente.
Se você tiver ensinado alguém a acender a luz.
Eis o segredo da tal imortalidade: escreva.

↕ Eterna Letargia

É do pesadelo que se cria o próprio sonho para escapar do caos?! Transformando a própria vida numa eterna letargia. Vivendo num sono profundo. Se sentindo morto mesmo quando no peito ainda pulsa um coração juvenil. Estando preso a algemas imaginárias que se abririam, com um simples despertar. Prefere continuar com os olhos fechados, preso no seu mundo de nuvens de algodão-doce. Mundo onde os príncipes encantados realmente existem e não usam máscaras de bobos-da-corte. Mundo onde a mediocridade não se transformou em uma moda em que todos almejam consumir e exibir como um prêmio. Mundo este que não existe. Medíocre, um verdadeiro coitado transformado em zumbi. Fechar os olhos para não ver a realidade. Se fazendo de cego diante do espelho, quando não engana mais ninguém. Sente vergonha do que vê refletido, afinal passou uma vida inteira escondido num sonho. Acordará no dia em que seus olhos estarão selados para sempre. E vai querer despertar, mas seu tempo terá passado junto com todas as oportunidades perdidas. E passará a eternidade da mesma forma que conduziu a sua existência: morto.

↕ Rogai, Rogai

Rogai, rogai. Uma prece que queima. Uma prece que dói. Reze suas preces. E reze para que elas te salvem. Reze para que elas consigam salvar alguém. Se você conseguir salvar uma alma, então você estará salvo. Se agarre em cada palavra. Reze, reze. Reze pelas pessoas sem direção. Reze para as pessoas que dizem NÃO! Chame sua atenção. Acene com a mão. Pessoas quebram a armadura, com um simples “aceno”. Segure sua mão. A puxe. A salve. A guie. Mostre a direção. O livre arbítrio não pode ser mudado. O livre arbítrio pode ser mostrado. Acenda a luz. Faça algo por ela. Faça algo por você. Erga-se! Nenhuma prece funciona se você apenas se ajoelhar, e ali ficar. Erga-se! Dê vida as suas palavras. Não espere, pois do céu somente cairão finas gotas de chuva. Erga-se! Vá em busca da sua alma pecadora. A encontre! A erga! A salve! A guie! A ensine a rezar. A ensine a rogar. E roguem juntas. Rogai por nós.