domingo, 9 de março de 2008

↕ sem título.

Ela está ali, contemplando-se há longas horas.
Se olha como se estivesse decifrando seu corpo, em busca de encontrar em seu rosto mais algum traço da mãe.
Então ela desiste e decide encarar a progenitora.
Quanto mais a olha parece que ainda está lá mirando o espelho do fim do corredor.
Os mesmos olhos, as mesmas mãos, a mesma boca.
Não vê o mundo da mesma forma que a mãe, nem aprendeu a agarrar as coisas sem deixar com elas caiam ou se esvaiam entre os dedos e nem tão pouco fala o que pensa com a mesma sutileza que a juventude materna um dia deve ter tido.
Como podemos ser tão iguais e ao mesmo tão diferentes?

E mais uma vez me pego diante do espelho.
Não é vaidade e sim o medo de me descobrir.
Descobrir mais uma semelhança ou outra diferença gritante.

Você se lembra daqueles dias em que tínhamos tudo e nada tínhamos?
Sim, e lembro de como fazia longas tranças em seus cabelos e ainda podia te ter no colo.
Tínhamos tudo e nada tínhamos.
Tínhamos uma a outra.
O que vou ser na vida?
Não importa, temos tudo e nada temos.
Temos uma a outra.

E o espelho ainda está lá.

sexta-feira, 7 de março de 2008

↕ A dor, o amor e o blues.

Gosto de gente doída. Talvez porque eu goste da dor. Talvez por isso eu goste de você. Talvez por isso eu goste do blues.
Ela, a dor. Você, o amor. Ele, o blues.
Inconcientemente todos fogem da dor ao mesmo tempo que a procuram sem cessar. Ridiculo não? O tempo todo a buscam. Eu não fujo, até simpatizo com ela.
Dizem que você só vai saber o que é o blues no dia em que souber o que é a dor.
E se a vida é um grande blues meu amigo, a dor é a essência. Só é possivel se sentir realmente vivo depois de sentir a primeira dor. O primeiro tombo, a primeira gota de sangue que escorre do joelho e desce até os pés, trilhando um caminho desenhado de vermelho. A primeira lágrima que molha teu rosto. O primeiro não!
Com o tempo você aprende que cair é fraqueza e chorar é tolice. Ou não, talvez viva e não aprenda nada.
Talvez por isso eu goste de você. Mas gosto muito mais da música em que você escarra a dor no meu colo. Gosto de você não por eu sentir amor, não mesmo, mas por sentir a dor, a sua dor que é tão minha quanto sua.
Amor, amor, de mãos dadas com a Senhora Dor. Cômico de dar dó! Fugimos dela, mas a procuramos durante a vida toda! A tal “alma gêmea”, a “metade da laranja”. Céus, queria um beijo na boca, agora!
Tolice talvez seja chorar lágrimas por ninguém e criar um escudo pra escapar da dor.

“Liberte-se-à, nunca mais!”
então agora lembrei do corvo, maldito animal do inferno, que apesar dos pesares, vive séculos e morre orbitando. O que isso tem haver com a dor e o blues? Talvez a relação entre tais equívocos é que, embora não possamos pressentir a morte e voar até o infinito pra morrer diante das estrelas, podemos sim viver a vida no embalo de um excitante blues.
Dizem que você só vai saber o que é um blues no dia em que souber o que é a dor, não é? Eu digo diferente: Você só vai saber o que é um blues no dia em que souber o que é o amor, a dor é o que te faz orbitar!
Mas eu não sou boa pra falar do que desconheço, por isso me calarei daqui a pouco, sem falar do amor.
Então não fale nada, acenda um cigarro e me beije, caro amigo.