“Gosto de gente doída”, escrevi aos dezoito. Parte disso ainda é verdade. Talvez
por isso eu goste de você. Talvez por isso eu goste de blues. O certo é que todos
fogem da dor, embora a procurem sem cessar. É uma mania inconsciente. O tempo
todo a buscam e hesitam admitir. Eu não fujo, nem nego. Até simpatizo com ela,
a considero necessária; desde que seja breve.
Dizem que a gente só sabe o que é o blues no dia em que conhece a dor – existe uma música mais ou menos assim. Mas se o músico tiver razão e a vida for realmente um blues cheio de versos, então a dor é a essência. Eu concordo. Só é possível se sentir realmente vivo depois de sentir a primeira dor. O primeiro tombo, a primeira gota de sangue que escorre pelo joelho trilhando um caminho carmim. Ou a primeira lágrima que molha o rosto – não aquela da infância, pedindo colo – aquela que mostra o quanto o mundo pode ser cruel.
Com o tempo você aprende que cair é fraqueza e chorar é tolice. Ou não,
talvez não tenha aprendido nada disso. Talvez por isso eu goste de você. Gosto
de você não por sentir amor, não mesmo, mas por sentir a dor, a sua dor; que é
tão minha quanto sua. Afinal, é tolice
chorar lágrimas por ninguém e criar um escudo frágil para escapar da
dor. É preciso aceitá-la, como uma amiga pouco cauteloza.
“Libertar-se-à, nunca mais!”. Eis o corvo de Poe, animal maldito, que morre
orbitando. O que isso tem a ver com a dor e o blues? Embora não possamos
pressentir a morte e voar até o infinito para morrer diante das estrelas, fomos
nós, homens, responsáveis por extrair da música muito mais que sonoridade.
Blues é, puramente, sentimento.
Dizem que você só vai saber o que é um blues no dia em que souber o que é a
dor. Eu digo diferente: você só
vai saber o que é um blues no dia em que souber o que é o amor; a dor,
garanto, é passageira. E quando ela te visitar,
não a ignore, ela te fará mais forte. Apenas tenha cuidado, garanta que ela
seja breve.
*Texto originalmente escrito em março de 2008, reeditado em junho de 2013.