Joelhos ao pé da cama, mãos unidas.
Às vezes o pensamento voa, corre por algo sem importância, alguma futilidade. Mas
a disciplina vem e, como se um tapa fosse dado na cara da consciência, a mente
se volta ao que me trouxe aqui. Então agradeço pelo dia, pelo amanhã. Peço
desculpas diante das falhas. Depois um Pai Nosso e um Amém. Na cama, mirando o
escuro, me pergunto se o que ainda me faz rezar é realmente fé ou é o medo que
me condicionaram desde criança. De ir pro inferno? De desagradar Deus? Não é
isso. Minha fé é só minha e por vezes soa incomum.
Compreendo e evito essa mania bípede
de humanizar Deus, achar que a tal imagem e semelhança significa que Ele é
feito das mesmas fraquezas que nós. Pois não, não é. Desde a infância não consegui
moldar um rosto imaginário para a figura de Deus, diferente de Jesus, retratado
em filmes e desenhos animados como o homem de cabelos compridos e olhar
amendoado. Meu eu da infância desenhou a imagem de cristo que ainda alimento.
Mas Deus, para mim, nunca teve rosto. Sempre pareceu uma luz forte emanada de bondade.
Essa força cuja ciência busca
reproduzir e identificar tampouco vai se materializar e dizer como devemos agir,
apontando soluções. Deus e sua infinita beatitude se manifestam de forma
singela; no vento que balbucia numa noite fria; no pássaro que beija o calor do
sol; está em cada riso de criança; em milagres sem explicação; no chuviscar que
banha a rua lá fora e embala meu sono. Ele também se mostra quando traz e leva
as pessoas. Quando as mantém por perto. Num abraço sincero. Naquele “eu te amo
pra sempre”. No verso daquele poema. Isso tudo, esperança e sabedoria, é Deus. É Deus!
Pode não parecer e justamente por
isso a compreensão é desafiadora: Deus também se mostra no triunfo zombador da
tristeza, naquele instante em que a dor impera e ameaça jamais cessar. Me
pergunto, ainda, como as pessoas que não acreditam Nele conseguem se manter em
pé nos dias em que tudo desaba em volta. Eu rezo. Agradeço e também peço, sim.
Que mal tem?
Não balance a cabeça desse jeito
armado com olhar reprovador! Nem solte esse risinho abafado de quem domina a
razão. O Deus que descrevo não é humanizado; por isso não falha. Te garanto que
minha fé não é medo, nem tolice de quem cresceu regrada a crer. O medo e a
obediência, confesso, vieram primeiro, em par. Mas depois veio a compreensão, o
arbítrio, a busca e o encontro com Deus. E eu o encontro desde menina. O sinto
todos os dias. Falo com ele antes de dormir. E todas as noites a mesma cena se repete:
joelhos ao pé da cama e mãos unidas.
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